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Upside Down

Um blogue de uma futura (e esperançosa) jornalista, que vê na escrita um refúgio para os bens e para os males da vida.

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Um blogue de uma futura (e esperançosa) jornalista, que vê na escrita um refúgio para os bens e para os males da vida.

OPINIÃO: Pedro Abrunhosa - tudo o que ele nos dá

Hoje não vos venho falar de mim, ou daquilo que estou a sentir, nem de um assunto que me revolta. Hoje, guardei um bocadinho do meu tempo para vos falar de uma pessoa que eu admiro sem sequer conhecer e que me tem acompanhado durante toda a minha vida.

Venho falar-vos de Pedro Abrunhosa. Como todos sabem, é um cantor português de renome, que completou no ano passado 20 anos de carreira. Não vou começar aqui com biografias esquisitas, se querem biografias fazem favor de consultar o Wikipedia.

A razão pela qual venho falar dele relaciona-se com a marca que ele deixou em mim desde que conheço as músicas que compõe e escreve. A música que me mais me faz vibrar é, sem qualquer dúvida, a “Tudo o que eu te dou”, mas nenhuma outra me passa ao lado. Desde as mais antigas às mais recentes, todas, sem qualquer exceção ou critério, me dizem algo.

Já o vi duas vezes ao vivo e tive a sorte de estar pessoalmente com ele, mas prometi a mim mesma, desde a primeira vez, que iria a todos os concertos próximos da minha zona, não porque goste de ver coisas repetidas, não porque dê um valor enorme a ver um cantor ao vivo, mas porque o espetáculo dele não é apenas um concerto com meia dúzia de músicas. É mais que isso. É um momento de paz, em que todas as pessoas presentes se unem para partilhar, por algumas horas, o que sentem quando ouvem aquelas músicas. Sinto magia cada vez que o ouço ao vivo. 

Todas as músicas deste cantor me dizem algo, mas as que mais me têm marcado são aquelas que falam de perda e que são dedicadas ao seu falecido irmão. Pedro Abrunhosa sabe escrever a dor de uma forma tão bonita que nos faz sentir a dor dele e partilhá-la. As suas músicas são misteriosas e, ao mesmo tempo, transparentes, porque quem sentiu aquela dor, sabe reconhecê-la em cada música.

Para aqueles que dizem que não é um cantor, mas sim um intérprete, ou alguém que "diz umas coisas", não percebem quão enganados estão. Estão no direito de não gostar das músicas ou do estilo, mas nunca poderão afirmar que ele não é um cantor, porque acreditem que o é. Se as músicas dele fossem cantadas em vez de "quase faladas", não tinham metade do significado que têm.

Não sei por que razão decidi escrever este texto, mas senti uma vontade enorme, porque há pessoas que nos marcam sem sequer nos conhecerem, que acompanham a nossa vida, a nossa dor e nos fazem perceber, muitas vezes, que não somos os únicos a perder alguém, ou a amar alguém.

Ao Pedro, um muito obrigada, por ser a única pessoa capaz de descrever exatamente o que sinto, fazendo-me, simultaneamente, sentir muito melhor. Que continue a ser o (na minha opinião) melhor músico, intérprete e cantor português da atualidade. 

PESSOAL: "A morte é a curva da estrada"

De vez em quando, no meio de toda a poeira dos meus dias, lembro-me de uma pergunta que há tanto tempo paira na minha cabeça e à qual nunca consigo responder: o que é a morte?

A morte está muitas vezes no meu pensamento, não porque seja pessimista ao ponto de pensar que toda a gente pode morrer a qualquer altura, mas porque só muito tarde tive noção da sua existência e, como tal, sinto-a mais presente no meu dia-a-dia, pois desde que a conheci nunca mais me esqueci dela.

Até aos meus 14 anos pensava que a morte só acontecia aos outros. Ela existia, sim, mas não existia na minha vida, na vida das pessoas que amo. A morte era uma coisa que acontecia a pessoas afastadas de mim, mesmo que algumas até fossem da minha família. Família mais afastada. Para mim era impensável as pessoas que amo morrerem enquanto eu fosse nova, porque as pessoas que amo teriam de estar presentes nos momentos mais marcantes da minha vida, era por isso que se chamavam família e amigos, era por isso que estavam ao nosso lado. Chamem-me ingénua se quiserem, talvez o fosse, mas era feliz assim e quem me dera voltar a sê-lo. 

Um dia, a vida tirou-me essa ingenuidade. O mais curioso é que é a vida que nos traz a morte. Estavamos a 14 de Outubro de 2010. Uma quinta-feira cheia de sol que nunca mais esquecerei. O meu avô estava internado há 12 dias e eu não o tinha ido ver, porque ele ia voltar. Já tinha ido tantas vezes para o hospital, tendo sempre voltado, qual seria a diferença desta vez? 

O que é certo é que não voltou. Não voltou a bater-me à porta para saber o resultado dos jogos do Benfica, não voltou a tropeçar no carregador do meu computador (deixando-me completamente zangada por causa disso), não voltou a abraçar-me até aos ossos e a dizer "estás quase do tamanho do avô", não regressou a casa depois de um jogo de cartas no café. Nunca mais voltou e foi aí que eu percebi que as pessoas que amamos também morrem. 

Já passaram quase 5 anos, estaria provavelmente agora na fase da aceitação. Mas não estou. Quem é que em seu perfeito juízo aceita que a vida nos leve as pessoas que mais amamos? Era suposto ele ter-me visto acabar o secundário, ter conhecido o meu namorado, ter-me visto entrar na universidade. Era suposto ele ir ao meu casamento, com o casaco que ele tinha para todos os casamentos das pessoas de quem ele realmente gostava.

Já esqueci a voz dele. Dói muito. Mas o pior não é esquecer. O pior é continuar a esperar que ele volte. Ainda hoje espero. Ainda hoje tenho esperança que seja ele a bater à porta, ainda hoje espero o momento em que ele volta e me abraça de novo até aos ossos. Só o meu avô sabia abraçar até aos ossos. Até ficar sem ar e ter de lhe pedir, resmungona, para parar. E quem me dera agora que ele nunca tivesse parado.

Há 5 anos a vida mostrou-me que a morte existe, que é real e que não acontece só aos outros. E é por isso que ela paira na minha vida com uma presença demasiado marcante. Agora sei que a vida nos tira as pessoas que mais amamos e que isso pode acontecer sem qualquer aviso, sem qualquer razão aparente. Ter essa consciência mata-me um pouco todos os dias. Era tão mais fácil quando eu acreditava que as pessoas que amo não podem ser levadas de mim.

Mas continuo à espera. E tive de aprender a caminhar enquanto espero, a seguir em frente enquanto acredito que um dia ele irá voltar. Sigo em frente porque é ele que me dá forças para o fazer. Mas como não ir abaixo quando a saudade aperta e quando me apercebo que passados quase 5 anos a dor ainda está tão viva e tão presente?

No fim de tudo isto, só me surge uma definição de morte: morte é esperar. Esperar um regresso que sabemos que nunca vai acontecer. Esperar um sinal que sabemos não existir. E ir caminhando enquanto se espera. Se vale a pena? Não, mas ajuda a continuar.